"Parabéns pelo trabalho, Heloisa! A análise sobre a fragilidade da resposta penal ao assédio sexual no Brasil é muito relevante. A dificuldade das vítimas em reunir provas e o medo de revitimização durante o processo judicial são questões sérias que precisam de mais atenção.
Minha pergunta é: quais medidas concretas você acredita que poderiam ser adotadas no sistema judiciário para melhorar a escuta das vítimas e evitar sua revitimização no processo judicial?"
Enviada em 30/10/2025 às 08:40:55 horas.
RESPOSTA DO AUTOR:
"Obrigada pela pergunta, e fico feliz que tenha se interessado pelo nosso trabalho. Acredito que existem várias medidas que poderiam ser adotadas no sistema judiciário para melhorar a escuta das vítimas de assédio sexual e evitar sua revitimização.
Primeiramente, a capacitação contínua dos profissionais do sistema de justiça é fundamental. Isso inclui juízes, advogados, promotores e policiais, para que eles possam lidar com os casos de forma mais sensível e informada, especialmente sobre os traumas que as vítimas vivenciam. A formação sobre a perspectiva de gênero e a violência estrutural é essencial para evitar perguntas e atitudes que re-vitimem a vítima durante o processo, como, por exemplo, perguntas sobre vestimenta ou comportamento.
Outra medida importante seria a criação de varas especializadas em violência de gênero, ou ao menos juízos especializados em crimes como o assédio sexual. Profissionais com maior experiência nesse tipo de crime poderiam lidar com os casos de forma mais eficaz, compreendendo melhor as particularidades de cada situação.
Além disso, penso que a melhoria nas práticas de depoimento pode contribuir muito. As vítimas de assédio sexual muitas vezes sentem que precisam reviver o trauma diversas vezes. Portanto, a implementação de depoimentos gravados ou a possibilidade de o depoimento ser dado de forma protegida — sem a necessidade de a vítima se expor publicamente em audiência — ajudaria a reduzir a revitimização.
Outro ponto crucial é o acesso a apoio psicológico e jurídico durante todo o processo. Muitas vítimas enfrentam sérias dificuldades emocionais enquanto passam pela investigação e pelo julgamento, e a presença de apoio psicológico seria um alicerce fundamental. Além disso, um acompanhamento jurídico qualificado para garantir que os direitos das vítimas sejam respeitados e que elas compreendam claramente o que está acontecendo no processo é de extrema importância.
Em relação à proteção da vítima, a garantia de medidas protetivas mais ágeis e eficazes, como o afastamento do agressor do ambiente de trabalho ou a imposição de restrições de contato, são essenciais para garantir a segurança da vítima durante o curso do processo.
Por fim, acredito que é necessário promover uma verdadeira cultura de escuta ativa. Isso significa que as vítimas devem ser ouvidas de forma atenta e respeitosa, sem julgamentos, e que sua narrativa seja considerada um elemento fundamental na construção da prova, sem que isso dependa exclusivamente de evidências materiais, que nem sempre estão disponíveis.
Em resumo, a mudança passa por uma combinação de medidas estruturais no sistema de justiça e pela adoção de práticas mais humanas e sensíveis ao lidar com as vítimas de assédio sexual.
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Respondida em 30/10/2025 às 09:51:48 horas.